terça-feira, 16 de setembro de 2008

Noites perdidas...


Perdi mais uma noite à tua procura. Subi todas as escadarias por onde nos escapávamos em direcção à luz, entrei nos bares que frequentávamos até ao raiar do dia, encostei-me à tua casa onde a claridade nunca mais entrou e no fim regressei, já a silhueta do sol era visível. Entrei tão cansado em casa que preferia que o amanhã não existisse, mas apenas um mundo uma semana depois. Não percebo porque continuo a procurar-te se já não existes. É como se buscasse um espectro no meio de uma cidade iluminada, sabendo à partida que não te posso encontrar porque já não és como eu te procuro. Talvez já te tenha descoberto sem saber que eras tu que retomavas o caminho dos vivos…

Mesmo assim, às vezes, gosto de pensar que ainda te lembras do meu nome e que não o riscaste como se apaga um contacto do telemóvel. É estranho como a quebra de laços causa mossas ao amor-próprio, como se fossemos feitos de afectos e qualquer perda significasse menor realidade. Também nunca percebi a estratégia de fugir ao amor pela ausência no sentido geográfico, tal como tu. Julgo que a solução mais óbvia seria ficar perto, demasiado perto, e aos poucos comprometer a espera e o aceno. Tempos depois seríamos tão invisíveis como o são os companheiros de viagem numa carruagem de metro.

Mas a distância, pelo contrário, conserva as coisas como eram. Uma espécie de frigorífico dos afectos e de corpos que não deixa apodrecer os rostos e os sorrisos. Aliás, a distância torna mais luminoso o passado, porque a memória apenas selecciona o que garante a continuidade do bem-querer. Por isso, vinte anos depois, uma face alterada pelas desilusões do tempo e da vida, resta mais rejuvenescida, recauchutada pela saudade. Alguém que se ausenta não se corrompe porque permanece como uma fotografia numa moldura, mesmo sabendo-se que foi subvertida pelo funil do tempo, por aquela oxidação que enferruja os ossos, a pele e os próprios medos.

Desse modo, queria ver-te. Não para te mostrar a minha face decepada por sulcos onde se arrastaram as lágrimas vertidas, apenas para te olhar como hoje és, na distância, como um detective privado que tira fotos da amante do marido traiçoeiro. Sem que tu me olhasses naquela frieza assassina que trata o passado como um chão minado. E assim, um instante valeria por vinte anos de atraso e a memória não ficaria retida nos alicerces de tudo o que aconteceu entre nós.

3 comentários:

gingerandclove disse...

"if one could kill time without injuring eternity"..

http://www.photosight.ru/photo/alone/2163479/

::::: disse...

Nós somos emoções...

Beijo

zemac disse...

Bem...straight to the heart!!!