Encostei-me ao cansaço, mudo e quedo, como um morcego de pernas para o ar na escuridão da gruta. Não quis corresponder às chamadas entusiastas dos que lá fora são apologistas da vida pura e dura. Daqueles que lutam por uma vida esgotada ao segundo e que têm pena de mim por desperdiçar grande parte do tempo em actividades triviais e silenciosas. O telemóvel parece um doido furibundo que se contorce com frequência em cima da mesa da sala. Grande apologista da vida airada, é um amigo de bolso com quem não tenho grande afinidade. Olho-o a retorcer-se de dores, com um assobio de aflição e quase sinto pena dele.
Vivo numa ruela onde as frontarias das casas sustentam letreiros de perigo de derrocada e quem frequenta os cafés das arcadas é gente de calções que chega da praia e pede caracóis com imperiais. Nada tenho contra eles, mas preferia encontrar pessoas enigmáticas que aceitassem discutir assuntos profundos e, no final, me concedessem as chaves mestras dos mistérios em que a existência se enreda. Essas pessoas existem porque vejo os seus discípulos, bem penteados, vestidos de roupa engomada e pastas pretas de gente séria à procura de outros que também queiram conhecer a verdade. Eles aproximam-se e batem-me à porta como velhos conhecidos, mas eu não quero intermediários, gostava de conhecer pessoalmente os profetas. Já ouvi dizer que a maioria é fraudulenta e ambiciosa, mas acredito que haja autênticos, como sempre houve. O que terei de fazer para me procurarem? Já tive êxito quando era de bom-tom o conhecimento de chalaças que colocavam grupos em delírio. Hoje ninguém quer saber de anedotas, apenas citações difíceis, profundas, bem como análises de política internacional e soluções arrevesadas para derrubar governos hipócritas e corruptos. Em mim nada encontro de tão interessante.
Assim, pouco há a fazer. O mundo ainda é mais entediante que esta música formatada que sai do túnel sombrio do rádio. Pelo contrário, as lombadas dos livros à minha frente escondem percursos obscuros que sempre senti prazer em desvendar. Identifico os que mais me emocionaram ao longo destes anos. Sei de cor os que mais me tocaram no fundo, mas não recordo as razões. Depois de se ler um livro, fecha-se a sete chaves para que a vida não se esbanje quando o vento o abre e as folhas esvoaçam. O segredo que se desvenda pela leitura esgota-se quando o livro se encerra e se emparelha com os outros. Fora alguns pormenores superficiais e supérfluos, nada mais resiste. E não é por falha de memória, mas porque a emoção só perdura no acto de ler e tudo se perde quando se encosta a cabeça na almofada. Captamos apenas o assunto, mas o assunto é um pequeno pormenor desprezível. Tentem esclarecer alguém porque gostaram de um bom livro! E é pena, porque se os livros se dessem a quem os lê, possivelmente, já teria aquilo que procuro, aquela mensagem que me garantiria o enigma da vida.
Cala-te telemóvel! Deixa-me em paz…
Em poucas palavras enviei mensagens de que não estou interessado na excitação, não só pelo receio da ressaca como por ter perdido o gosto da demência. Mas não é desconsideração pessoal, nem crítica a semelhante postura. Enquanto se emocionam com o colorido do mar e com o azul da festa, prefiro pesquisar o tecto branco embalado pela música do rádio. Aguardo até esgotar a paciência. Não me vou mexer até sentir que o movimento é um degrau para o aprazimento. Às vezes, tento desencaixar o pé só para ter a certeza que ainda sou dono dos músculos e engulo saliva para ter a certeza que não estou a dormir.
Vivo numa ruela onde as frontarias das casas sustentam letreiros de perigo de derrocada e quem frequenta os cafés das arcadas é gente de calções que chega da praia e pede caracóis com imperiais. Nada tenho contra eles, mas preferia encontrar pessoas enigmáticas que aceitassem discutir assuntos profundos e, no final, me concedessem as chaves mestras dos mistérios em que a existência se enreda. Essas pessoas existem porque vejo os seus discípulos, bem penteados, vestidos de roupa engomada e pastas pretas de gente séria à procura de outros que também queiram conhecer a verdade. Eles aproximam-se e batem-me à porta como velhos conhecidos, mas eu não quero intermediários, gostava de conhecer pessoalmente os profetas. Já ouvi dizer que a maioria é fraudulenta e ambiciosa, mas acredito que haja autênticos, como sempre houve. O que terei de fazer para me procurarem? Já tive êxito quando era de bom-tom o conhecimento de chalaças que colocavam grupos em delírio. Hoje ninguém quer saber de anedotas, apenas citações difíceis, profundas, bem como análises de política internacional e soluções arrevesadas para derrubar governos hipócritas e corruptos. Em mim nada encontro de tão interessante.
Assim, pouco há a fazer. O mundo ainda é mais entediante que esta música formatada que sai do túnel sombrio do rádio. Pelo contrário, as lombadas dos livros à minha frente escondem percursos obscuros que sempre senti prazer em desvendar. Identifico os que mais me emocionaram ao longo destes anos. Sei de cor os que mais me tocaram no fundo, mas não recordo as razões. Depois de se ler um livro, fecha-se a sete chaves para que a vida não se esbanje quando o vento o abre e as folhas esvoaçam. O segredo que se desvenda pela leitura esgota-se quando o livro se encerra e se emparelha com os outros. Fora alguns pormenores superficiais e supérfluos, nada mais resiste. E não é por falha de memória, mas porque a emoção só perdura no acto de ler e tudo se perde quando se encosta a cabeça na almofada. Captamos apenas o assunto, mas o assunto é um pequeno pormenor desprezível. Tentem esclarecer alguém porque gostaram de um bom livro! E é pena, porque se os livros se dessem a quem os lê, possivelmente, já teria aquilo que procuro, aquela mensagem que me garantiria o enigma da vida.
Cala-te telemóvel! Deixa-me em paz…
3 comentários:
Então, não? As conversas acompanhadas por imperiais e caracóis ou tremoços também são interessantes!
Eu tenho dois telemóveis e não gosto de nenhum.
Serão os livros, então, os profetas, os receptáculos da verdade. Pelo menos, alguns. Os tais que sabemos de cor. Por encerrarem nas suas páginas o leme que nos vai guiando e desvendando horizontes. Sempre mais e mais. Portanto, os profetas já te bateram à porta, não achas?
Bj
é isso Maria, tens razão. beijo
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