Há alguns anos atrás, andar à boleia era uma actividade lúdica de enorme significado. Pertencia aos espíritos libertos e criadores e respondia à ânsia de alforria. Era económico, ousado e usufruído por todas as classes sociais. Significava antes de mais aventura e só nalguns casos falta de posses. Quando se cravava ao vento o dedo da mão direita não se sabia quem vinha e para onde se ia. Ia-se para qualquer parte.
Eram os tempos fogosos das viagens sem rumo. Dar-se boleia era um acto social de irrepreensível sentido de cidadania e o sujeito da boleia tinha um estatuto digno de consideração e aplauso. Havia uma espécie de acordo tácito entre o automobilista e quem tinha urgência em mudar de ares. Como se transportar gente estranha fosse um instrumento de reforço dos elos sociais e querer mudar horizontes uma necessidade vital de quem acordou recentemente. Por isso, quem não se detinha ao gesto, com meneios incisivos explicava que a sua viagem ou terminaria em breve, ou ia mudar de direcção ou então no habitáculo não cabia mais ninguém.
O tempo e o modo passaram com um rastro indelével. Mas a sociedade e a vida modificaram-se de tal forma que o próprio assunto parece pertencer a tempos ainda mais remotos. Dar boleia é tão arrojado como abrir escancaradamente a porta de casa a um estranho que venda bíblias. Poucos se atrevem a ser simpáticos para desconhecidos com um dedo em riste, permitindo que se intrometam na sua vida na brevidade de uma viagem!
Mas a poesia do acto permaneceu. Abrir portas à partilha do trajecto não é mais do que uma metáfora da própria vida. Nela damos boleias a pessoas desconhecidas que aos poucos vão fazendo parte de nós e da nossa própria viagem. Quando alguém nos pergunta o rumo confiamos no golpe de vista e abrimos a porta com confiança. Mesmo que após paragens forçadas nos apartamos e cada um vá para o seu lado. Não é esse o destino de todas as relações?
Andar à boleia é então uma boa definição de nós. Alguns mais obstinados e desconfiados, preferem o silêncio ou o som do rádio à partilha do seu espaço. Há outros que param, se mostram disponíveis, mas os que encontram não aderem, decepcionados com a direcção proposta. E há ainda os renitentes em sair da estrada, preferindo pequenos trajectos, inconsequentes. Mas a viagem é a nossa matriz.
Eram os tempos fogosos das viagens sem rumo. Dar-se boleia era um acto social de irrepreensível sentido de cidadania e o sujeito da boleia tinha um estatuto digno de consideração e aplauso. Havia uma espécie de acordo tácito entre o automobilista e quem tinha urgência em mudar de ares. Como se transportar gente estranha fosse um instrumento de reforço dos elos sociais e querer mudar horizontes uma necessidade vital de quem acordou recentemente. Por isso, quem não se detinha ao gesto, com meneios incisivos explicava que a sua viagem ou terminaria em breve, ou ia mudar de direcção ou então no habitáculo não cabia mais ninguém.
O tempo e o modo passaram com um rastro indelével. Mas a sociedade e a vida modificaram-se de tal forma que o próprio assunto parece pertencer a tempos ainda mais remotos. Dar boleia é tão arrojado como abrir escancaradamente a porta de casa a um estranho que venda bíblias. Poucos se atrevem a ser simpáticos para desconhecidos com um dedo em riste, permitindo que se intrometam na sua vida na brevidade de uma viagem!
Mas a poesia do acto permaneceu. Abrir portas à partilha do trajecto não é mais do que uma metáfora da própria vida. Nela damos boleias a pessoas desconhecidas que aos poucos vão fazendo parte de nós e da nossa própria viagem. Quando alguém nos pergunta o rumo confiamos no golpe de vista e abrimos a porta com confiança. Mesmo que após paragens forçadas nos apartamos e cada um vá para o seu lado. Não é esse o destino de todas as relações?
Andar à boleia é então uma boa definição de nós. Alguns mais obstinados e desconfiados, preferem o silêncio ou o som do rádio à partilha do seu espaço. Há outros que param, se mostram disponíveis, mas os que encontram não aderem, decepcionados com a direcção proposta. E há ainda os renitentes em sair da estrada, preferindo pequenos trajectos, inconsequentes. Mas a viagem é a nossa matriz.
3 comentários:
love the photo - could i see it somewhere, before:)?
now will look up "boleia" in a dictionary and try and tiptoe my way through the text (slow, slow:)
Poderemos dizer que a boleia, em tempos bastante atrás, estava ligada a uma forma irreverente de estar na vida. Hoje a boleia poderá ser o início de algo desagradável para a mesma...
pois é, a boleia era uma coisa muito gira... Mas hoje, com cada vez mais maníacos e psicopatas, desiquilibrados e pérfidos, tornou-se numa coisa perigosa, ainda mais arrojada! No entanto, sim, tem a sua poesia. O que eu não dava para um dia ir pelos quatro cantos do mundo em boleia!
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