sexta-feira, 18 de abril de 2008

Em Busca do Trivial

Às vezes, temo ficar enredado na simplicidade da vida, como se a vida pacata e feliz fosse apanágio dos mediocres. Esforço-me para me justificar a mim mesmo e aos mais próximos porque não procuro alternativas ao lento vaguear pelo empedrado do tempo. Afinal, todos parecem esperar a grande oportunidade, aquele alçapão mágico, que os leve a descobrir o seu nível de excelência. Permanecer, para a maioria, é exigir pouco de si mesmo. Permanecer é o resultado do medo do confronto com impasses insolúveis, densas desilusões, duras batalhas pela sobrevivência. Outros, para justificar a sua história simples e rotineira, garantem que nunca a alteraram porque não usufruiram do contacto com pessoas importantes que os puxassem para cima; ou não estavam no sítio certo quando a boleia do êxito passou. Como se os fracassos pessoais dependessem mais de outros do que deles.

Mas vou andando com aquele passo firme e procuro razões de busca ou de recusa de viagens. Penso melhor quando ando. Quando corro. Naquela passada certa ao ritmo de uma respiração mais ofegante. Com o sol ainda meio adormecido e a brisa fria das primeiras horas da manhã. Correr para onde? A sério, para onde? Para fora de nós mesmos? Será que acomodarmo-nos à vida é sinónimo de fraqueza de espírito?

Ou não será uma desculpa para não promovermos a auto-descoberta? A recusa do trabalho árduo na senda do melhor de nós? Tenho dúvidas, teremos de fazer contas e, em geral, somos péssimos contabilistas. Os passivos surgem porque, na maioria das vezes, não colocamos todos os dados nos pratos balança. O que poderíamos ter conquistado ao expulsar a capa de conforto que nos livra de inseguranças e do esforço redobrado? O que teríamos a ganhar e a perder pela ruptura com a condescendência, com a fraqueza, com a leviandade, com o encolher de ombros?

E lembrei-me de Steinbeck, num livro tão longínquo que se esconde o título, onde de uma forma crua condensava em duas vias a possibilidade da vida: a genialidade ou a mediocridade. Enquanto a primeira exigia a luta constante e diária pelo aperfeiçoamento individual, e teria de suportar a frieza, a ausência dos outros e a dor de ser incompreendido, com a segunda ganhava o calor, a promiscuidade e o prazer de ser aceite. E julgo que terminava, dizendo que se sentia feliz por ter escolhido a mediocridade, mas nunca saberia que recompensa teria obtido caso a sua escolha tivesse sido diferente.

E agora páro de correr, com o suor a escorrer pelo corpo. No parque da cidade apenas mais uma pessoa com o passada forte e perdido em pensamentos. O sol ainda jovem mostra o seu rosto mais familiar. Podemos olhar para ele sem medo de cegar, aquela massa avermelhada e revolta como um braseiro morno. O passo do coração vai deambulando já por ritmos mais pausados e pesquiso na memória espaços alternativos, onde a alma melhor se acomodasse. Mesmo alguns que me pertenceram no passado surgem com uma transparência vítrea. Não optaria por nenhum. Pelo menos nesta manhã de Abril fiquei convicto que o melhor será procurar a serenidade, aquele jogo de equilíbrio onde a vida não precisa de excelência, precisa de verdade e autenticidade.

3 comentários:

Anónimo disse...

Bonito, bonito, bonito.

Anónimo disse...

Faz-nos pensar no que realmente é importante na vida...
ser-se verdadeiro e autêntico naquilo que se faz e se diz, mas mais importante ainda é ser-mos verdadeiros connosco próprios. Isto sim, é sinónimo de excelência!
Um abraço com carinho e continue a encantar-nos com as suas palavras.

V. disse...

quem tudo quer, tudo perde?

:)

beijinho*

(na maior parte das vezes as viagens fazem-nos regressar a essa vida pacata e sem excelência aparente que noutros tempos recusámos sem saber. mas só partindo sem medo é que se descobrem estas coisas, não é verdade? uma viagem noutras paragens que nos dê a coragem de nos levar até nós... e a força para sobreviver a essa descoberta nem sempre feliz.)